máquina de retratos

retratos tirados ao acaso. objectos que chamam a atenção. o olhar. um olhar. o meu. sobre o mundo. o retratado. o fictício. o inexistente. o que já foi. o que ficou no filme. o que ficou gravado. uma máquina. falível, como todas as máquinas. um olhar. subjectivo como qualquer olhar. um retrato. fixo e eterno. como qualquer retrato.

4.30.2005

repetição

quando uma coisa nos fica a martelar, como as teclas de um piano, como um som de uma nota repetidamente repetido pelo toque dos dedos nas teclas, sempre nas mesmas....
quando uma imagem não sai da objectica, quando um som teima em voltar ao tímpano, quando um cheiro familiar nos invade no meio de uma rua apinhada de cheiros, quando um toque passado ainda nos eriça os pêlos dos braços e nos deixa um calafrio a percorrer o corpo...

quando acontece tudo isto? como? o que nos traz tantas recordações? como aparecem elas? de onde? onde as escondemos que ficam tão mal escondidas?

como é que uma máquina de retratos, uma simples máquina de retratos, pode ainda reflectir uma imagem que já não é?

4.29.2005

cor

porque a cor é importante. não só na fotografia como na nossa vida.
a cor é quase como o sal que metemos na nossa comida.
o tempero. o aguçar do sabor.
o realce.

4.26.2005

o momento mágico

o click. o carregar no botão. o captar de um momento e não outro. a escolha. o embate. o brilho.
aquele breve segundo em que o coração pára, em que os nossos olhos só captam aquela sensação, em que somos apenas um sopro, em que tudo se resume aquele brilho, aquele instante.
tudo tem um momento mágico. tudo. todas as escolhas que fazemos implicam esse momento. esse em que decidimos dizer sim em vez de não, esse em que sorrimos, esse em que nos aproximamos, esse em que falamos. esse em que carregamos no botão.
mas os momentos mágicos podem também ser momentos trágicos. momentos em que nada mais há a fazer. momentos em que tudo corre mal. em que a fotografia não ficou focada, em que, por esquecimento, a máquina estava sem rolo, em que tudo tremeu.

tudo na vida tem os seus momentos mágicos e os outros, os trágicos.
a vida está cheia deles. ela é, em si, um momento mágico e trágico. pelo menos quando vivida com intensidade.
todos já passámos, certamente, por esses momentos em que, consciente ou inconscientemente, tudo é brilho, tudo é belo, tudo é uma grande fotografia. em que tudo parece bater certo. em que o mundo faz, finalmente, sentido. em que sorrimos. em que dizemos sim sem pensar em mais nada. momentos em que nos enamoramos pela vida, pelo ser, pelo existir, pelo respirar.
todos também já vivemos os outros momentos.
o que me continua a transtornar, ao longo de alguns anos de existência e de confronto com a realidade, é a rapidez com que o momento mágico acaba e logo começa um momento trágico. como pode ser? como podemos nós estar tão bem num instante e, um segundo depois, um segundo passado depois do clique que retratou uma realidade perfeita e bela, tudo dá uma reviravolta e parece que já não sabemos lidar com uma máquina de retratos, que não conseguimos focar a objectiva para o ângulo mais risonho, que o mundo fica cinzento numa fotografia a cores.
como podemos desaprender tudo tão depressa? apenas um segundo depois. apenas um.
e a vida resume-se a estes dois segundos. apenas interrompida por centésimos de segundo em que ficamos suspensos, sem reacção, adormecidos para tudo.

quero momentos mágicos. quero conseguir retratar a beleza que por vezes sinto. quero ficar lá. quero conseguir não dizer não. quero ir.

4.23.2005

a máquina

pegar numa máquina de retratos leva-nos para uma realidade diferente. a da objectiva. a da ocular. a do mundo visto por um outro ângulo. geralmente é um mundo mais bonito.
as máquinas transformam a realidade.
mesmo uma fotografia que retrata uma realidade extremamente triste, consegue ser uma fotografia bela. muitas vezes as mais belas.
será que a tristeza é bonita?
que nos faz crescer, não há dúvida alguma... mas daí a ser bonita...
por outro lado, a alegria nem sempre é bela.

a espera pelo momento certo. pela pista. pelo sonho. pelo sorriso. pelo choro. pelo grito.
a espera é talvez o mais importante para uma fotografia. e para a vida. aprender a esperar. aprender a ser paciente. aprender a mudar de opinião. aprender a encontrar. aprender a continuar a esperar.

às vezes a espera demora mais do que aquilo que esperámos. às vezes ela traz-nos coisas surpreendentes. às vezes ela não nos traz nada. mas continuamos a esperar. a esperar para disparar. para fotografar a nossa vida.
às vezes ficamos, cobardes, à espera de tudo. à espera que o mundo continue a girar, à espera que a vida corra, à espera que os outros venham ter connosco, à espera que tudo passe.
às vezes precisamos levantarmo-nos e procurar outro ângulo, outra máquina, outra objectiva, outro rolo, outra luz. às vezes a espera só prolonga o que não é.

4.22.2005

o retratado

o que nos leva a retratar, a fotografar, a olhar? o que nos fixa o olhar? o que nos retém uma qualquer imagem mais do que qualquer outra? o que existe?

o que nos leva a uma outra questão: por que somos atraídos por certas pessoas em detrimento de outras, talvez, qui ça, mais interessantes?
há imagens que mantenho na minha memória como uma fotografia. há sensações que lá estão também. e momentos. e pessoas.
coisas, situações, sensações, imagens, pessoas e momentos que me marcaram, tanto felizes como tristes. são mais as felizes que as outras. a nossa memória é sempre selectiva.
ainda noutro dia estava a pensar que defeitos existiam, que problemas precipitaram uma opção... e não me consegui lembrar de um. nada. e sei que eles existiram. só não sei quais foram. não foram importantes o suficiente para os guardar em mim. será que, para além desses problemas e defeitos, também a situação foi assim tão insignificante?

gosto de ver que, de algum modo, marquei algumas pessoas com memórias. (ainda noutro dia, uma pessoa que há-de sempre figurar nos meus retratos escreveu qualquer coisa parecida...) é tão bom... é um sentimento de que vamos ser eternos. de que estamos em alguém. de que a vida não passou. de que aquele momento não foi apenas um momento. de que as opções não foram em vão.

gosto de fotografar pessoas. umas mais que as outras. gosto de fotografar crianças. pela sua aparente inocência. os mais velhos pelas rugas, pelas fotografias que trazem espelhadas no rosto. pessoas difíceis. pelo desafio que representam. porque ficam para sempre no nosso album.